20 de abril de 2024

Como é bom torcer contra time ruim e ainda ter uma ajudinha do juiz

Cursos e discursos da lei

A semana passada foi dedicada ao Meio Ambiente e começou com uma friagenzinha assim, de leve, anunciando queda da umidade no verão amazônico cada vez mais seco. Nunca liguei muito pra essas datas, dia disso, semana daquilo, não vou a solenidades ou comemorações, mas vejo as notícias. Aconteceu do ministro contra o ambiente ser vaiado na sessão solene do Senado. Certamente arrependeu-se de ter ido lá, ao invés de vir ao Acre a convite do senador anti-ambiental para demonstrar, diante de uma platéia ruralista, seu apoio ao projeto que visa extinguir as reservas legais e ainda aproveitar para aprender com a política local. O discurso oficial, por aqui, é claro: se o “seu Imac” aparecer multando alguém, vocês não paguem nenhuma multa e avisem ao governador, que ele vai dar uns cascudos nesse pessoal que quer atrapalhar a produção.

Esse tipo de valentia não aconteceria tão livre e frequentemente, se aqui existisse Ministério Público. Não sei qual em qual artigo da lei isso se enquadra, mas é crime prometer impunidade aos eventuais infratores e ainda fazer ameaças contra os servidores públicos que tentarem cumprir a lei. Um processo legal talvez não mudasse a política oficial de destruição do meio ambiente, mas poderia, quem sabe, induzir os políticos a fazerem discursos menos inflamáveis.

Mas isso deve ficar por conta da tal alternância de poder na democracia. O inteligente leitor, eleitor esperto, decidiu que agora é a vez da esquerda apanhar e a direita ficar por cima da lei, não foi mesmo? No Brasil, quem ganha a eleição para o executivo leva o Judiciário de brinde. Já o Congresso, tem que comprar, não tem jeito.

Na semana seguinte, o ambiente mudou. Foram “vazadas” as mensagens que os heróis da vida pública trocam na privada. E agora tá todo mundo se retorcendo para explicar que a lei é como sapato, o que aperta num pode ficar frouxo no outro etc. e tal.

Caro leitor amigo, sei que é doloroso aceitar a idéia de que Lula (culpado, é óbvio, não é isso que se discute) foi condenado sem provas num julgamento político. Creia, para mim também é muito chato ter que concordar com o antipático colunista Reinaldo Azevedo, mas são ossos do meu ofício e tenho que roer. Quanto a você, ah, não quer botar a mão na consciência e reconhecer que foi engabelado pela direita nos últimos anos da mesmíssima forma como havia sido engabelado pela esquerda nos anos anteriores? Que tem vivido num mundo fake, uma pseudo-realidade criada por mensagens preparadas para mexer com seu “emocional” e deixá-lo predisposto a acreditar em mitos e segui-los cegamente? Que suas opiniões são construídas com estímulos calculadamente dosados e enviados pelas redes virtuais? É compreensível. Dói saber que é apenas mais um na manada, dói ainda mais ser excluído dela.

Sei que é a irresponsabilidade é uma atitude de defesa, a fuga possível de uma realidade insuportável. Também darei risada, por exemplo, se aparecer um meme em que o Ministro da Justiça cai e sai rolando infinitamente, como Neymar na Copa do Mundo. Também vou achar engraçado se alguém retratar o juiz Moro de Batman e o procurador Deltan de Robin. Claro, quem não se divertiu com os memes que ressaltavam a burrice da Dilma ou a cachaça do Lula? Pau que dá em Chico também dá em Francisco, não é mesmo?

Menos, muito menos divertidas, no entanto, são as mentiras simples e diretas: notícias falsas, calúnias, imagens deformadas para atribuir aos inimigos comportamentos bizarros ou criminosos. E e disso que temos vivido, nos últimos anos, e com tal intensidade que já nem percebemos o quanto o pensamento está viciado e automatizado. Olha só: um dia desses, um desses filhos numerados do capitão-presidente participava de um programa de televisão, num desses jogos de adivinhar palavras. Ele tinha que falar uma palavra que servisse como pista para que outra pessoa adivinhasse a palavra oculta. A palavra oculta era “livre”. Qual a palavra que ele falou para a dar a dica? “Lula”. Claro, uma coisa lembra a outra. E precisamos ganhar o jogo, mesmo caindo no ridículo.

Não há lógica, raciocínio ou dedução. Tudo é automático. E se o procurador não sabe encontrar a pista, o juiz dá uma dica pelo celular. O caro leitor, eleitor barato, não vê nada demais nisso. Todos fazem, é assim que a coisa anda. Como diziam os corruptos de antigamente, se não tiver um “por fora”, não se faz nada no Brasil. Pensou que isso tinha mudado? Foi institucionalizado. “Emendas impositivas”, é o nome que ganha no Congresso. Aliás, o Congresso… Há cerca de vinte anos tinha por lá um deputado que atendia pelo apelido de Quinzinho. E não era diminutivo de Joaquim, que o nome dele era bem outro, mas porque o rapaz ficava com quinze por cento de cada emenda que destinava às prefeituras de seu estado.

É um sistema, um estilo de vida, um padrão civilizatório: gratificações, auxílio-paletó, verba de gabinete, cartão corporativo, aposentadoria especial, emagrecer comendo tudo, aprender inglês enquanto dorme… um mundo de facilidades para quem é vivo. Quem não entra é porque não pode, ou é bêsta. Não me venha o prezado leitor dizer que é bêsta, ou inocente, ou não sabia, ou que não se faz uma omelete sem quebrar os ovos, ou que em terra de sapo há que ficar de cócoras. Nem me fale do Brasil ou qualquer país imaginário, por favor. Diga assim: a outra facção não me deu nada, resolvi apoiar esta para ver se arranjo alguma coisa.

Costumo dizer que a única vantagem de torcer pelo Vasco é que, pelo menos, não sou flamenguista. A direita é assim: a única vantagem é não ser de esquerda. No mais, todo time reclama quando o juiz está do lado do adversário -e o bandeirinha também.

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